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Nocaute: Uma luta pela igualdade no boxe feminino

Por Michel Tavares

É verdade que o boxe é considerado um dos esportes mais violentos do mundo e para muitas pessoas, a prática está diretamente relacionada à masculinidade, um domínio de homens, e dependendo da perspectiva de cada um, o boxe seja brutal. Mas, historicamente, o gênero feminino também se distinguiu nos ringues de luta, a cada dia as mulheres vêm ganhando espaço em territórios até então dominados exclusivamente por um só gênero.

As preocupações (principalmente masculinas) de que este esporte era demasiado brutal e inadequado para as mulheres praticarem ou competirem persistiram por um tempo surpreendentemente longo. Conforme os chamados papéis de gênero “naturais”, fundamentados em teorias, as mulheres deveriam cuidar de sua saúde física com a ajuda de outras modalidades, por exemplo, ginásticas “suaves” e ser educadas para se tornarem “moças graciosas e elegantes”.

Para os homens, os cuidados preventivos de saúde eram conotados com força e combate, capacitando-os a assegurar a “sobrevivência do povo” como cidadãos e soldados. Assim, as artes marciais como o boxe receberam o predicado “masculino”, enquanto as mulheres que se aventuravam no boxe colocariam em risco a própria “beleza”. Apesar de o boxe ser um esporte muito popular há anos entre os homens, ainda há um estigma muito grande com mulheres que lutam. No Brasil a modalidade foi uma das proibidas pelo decreto-lei n.º 3.199, de 14 de abril de 1941, pelo então baixado pelo presidente Getúlio Vargas, que impedia mulheres de praticarem esportes incompatíveis com a “natureza feminina”, como futebol, rúgbi, halterofilismo e lutas.

No entanto, atualmente cresceu a percepção, como em outros esportes, de que o boxe é benéfico para a saúde, o condicionamento físico ou a autodefesa. Tendo isso em mente, muitos clubes ou academias começaram introduzir treinos de boxe como exercícios físicos para mulheres. Hoje, com a popularização dos esportes de luta e dos torneios do UFC, é comum vermos atletas femininas dando um show nos ringues.
Conhecido como “nobre arte”, o boxe esteve presente nas olimpíadas desde a antiguidade, mas disputada apenas por homens, as mulheres só puderam competir no palco olímpico a partir de 2012, na olimpíada de Londres a primeira 100% para mulheres.

O torneio de Londres contou também com a primeira medalha brasileira no boxe feminino, o bronze conquistado por Adriana Araújo na categoria até 60 kg. Entre Londres-2012 e Rio-2016, o esporte tinha apenas três categorias femininas. Já em Tóquio-2020, foram cinco ouros disputados.
Entre os esportes que serão disputados na próxima Olimpíada, o boxe foi o último que deixou de ser exclusivamente masculino. Os Jogos Olímpicos diminuem a diferença entre homens e mulheres participantes e a expectativa é de que, em Paris-2024, o número de vagas seja exatamente igual.

De olho na formação de novas atletas de alto rendimento e futuras medalhistas a Rede Olímpica e o Instituto Movimento em parceria com o projeto social intitulado Das Ruas Para os Ringues, vem formando campeãs em diversas categorias do boxe, a iniciativa além de formar tem o intuito ajudar a tirar jovens meninas da comunidade das ruas, além de apresentar uma nova perspectiva de vida.

Isabella Gomes (Bella), é exemplo disso, a lutadora já foi bicampeã paulista e convocada pela Federação de Boxe do Estado de São Paulo (FEBESP) como representante paulista no Campeonato Brasileiro onde consagrou também campeã. A lutadora diz que o projeto mudou bastante a sua vida, até mesmo na sua relação com a família e escola. Bella iniciou sua carreira no boxe em 2015 aos 16 anos e disputou seu primeiro Campeonato Paulista, com apenas três meses de treino, a atleta conquistou um terceiro lugar. Mesmo com a pouca idade, ela já enfrentou discriminação por ser uma mulher em um esporte de supremacia masculina.

“O preconceito vem das pessoas que desconhecem o esporte, apesar de ter muitos treinadores que não aceitam treinar meninas, coisa que não acontece na academia onde pratico o boxe, sou muito grata ao treinador Fernando Bolacha Menoncello”. Diz ela.

Hoje a atleta é uma universitária em formação e continua praticando o boxe, mas de forma não competitiva.
Outro exemplo de superação é a atleta Victoria Cristina (Vick), que começou no boxe e projeto aos 13 anos, para cuidar da saúde através do condicionamento físico, hoje aos 17 anos além de campeã paulista, brasileira e melhor atleta juvenil do país, foi medalhista de bronze nos jogos sul-americanos disputado na Argentina, e representou o Brasil no Gymnasiade, evento multiesportivo mundial que ocorreu na França em maio de 2022.

Hoje vivendo do esporte, Vick é integrante da seleção brasileira juvenil de boxe, e almeja estar nos Jogos Olímpicos de 2028 na cidade de Los Angeles, nos EUA. “Sei do meu potencial e o que almejo através do boxe, há mais a conquistar. Mesmo sendo um esporte considerado por muitos, um lugar só de homens, eu já tenho alguns títulos importantes não só para mim, mas para a categoria feminina, e devo participar de competições internacionais nos próximos meses, e já tenho um objetivo claro. Quero estar nas Olimpíadas em 2028 e quem sabe trazer uma medalha não só para o Brasil, mas para o boxe feminino”, garante Vick
Para Juliana de Almeida (Juu), Campeã de boxe dos jogos abertos de São Paulo, a modalidade esportiva vem mudando sua vida, e nos últimos anos a luta das mulheres pela igualdade de oportunidades no boxe tem dado frutos, com a inclusão do boxe feminino nos Jogos Olímpicos e o surgimento de grandes nomes femininos no esporte.

“Infelizmente, tanto no passado quanto na atualidade, o boxe tem sido marcado por preconceito e discriminação, e historicamente, o boxe era considerado um esporte exclusivamente masculino e a participação das mulheres era vista como inapropriada e até mesmo perigosa. Isso levou a uma falta de investimento e de oportunidades para as lutadoras, que muitas vezes eram impedidas de treinar e competir nos mesmos níveis que os homens.

Mas esse cenário vem mudando e a cada dia surge uma nova atleta em vitrine no esporte, assim como minha amiga de academia Vick, temos hoje no cenário feminino atletas como Beatriz Ferreira e Rose Volante, mas não podemos esquecer o que as atletas Roseli Feitosa, Adriana Araújo e Érica Matos, fizeram por nós mulheres nas olimpíadas de Londres”, Conclui Juu.

A iniciativa “Das Ruas para os Ringues” vem se destacando pela sua ação transformadora, estimulando o desenvolvimento de jovens atletas mulheres, por meio do boxe feminino, a academia que é considerada a segunda melhor de São Paulo na categoria feminina e uma das melhores do estado ao nível geral.
Para o treinador e pugilista das atletas, Fernando Menoncello finaliza, “Hoje em dia, o boxe feminino está recebendo destaque e visibilidade como nunca antes. Por isso, acreditamos que todos devem ter oportunidades iguais de praticar e desenvolver seus dons, independente de gênero, e nossa missão é criar um cenário no qual mulheres possam lutar com igualdade e respeito, além de trazer mais diversidade ao boxe. Que essas jovens atletas possam se tornar verdadeiras campeãs não só no esporte, mas na vida”.

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